post dedicado a Roberto Melo
Com Roberto viajando por Assis, não
poderia deixar de comentar a “questão giottesca”, com o “maestro
de Jacó” e a posição de Bruno Zanardi, o restaurador dos famosos
afrescos de Assis após o terremoto.
"Master of the Isaac Stories - Scenes from the Old Testament - Isaac Blessing Jacob -Master of the Isaac Stories - Scenes from the Old Testament - Isaac Rejecting Esau - WGA14571.jpg - imagens de Domínio Público
Essa é uma história
difícil de contar, pois há duas introduções, que se juntam numa
trama, que acaba com um grande ponto de interrogação. A coisa boa é que este post acaba com mais uma grande lista de igrejas para ver em Roma!
A dúvida
sobre quem era e quando nasceu Giotto e a segunda toca o que
significava uma “obra” de pintura na Alta Idade Média. Vou
começar pela primeira, para esquentar; mas lembre-se, é um início
biforcudo, depois vamos ter que pegar a outra ponta para poder
começar!
Giotto di Bondone
nem sabemos exatamente como se chamava: “Giotto” poderia ser um
apelido de Angiolo ou Ambrogio; também é incerto o ano em que ele
teria nascido. As vozes mais fortes afirmam o ano de 1267 – a outra
data, a de 1276, é eventualmente considerada por alguns como
escolhida para exagerar e assim, exatar e mistificar, a idade do
jovem gênio.
O pintor Giotto deu
origem a inúmeros mitos, entre os quais o da sua descoberta por seu
maestro, ninguém menos do que Cimabue, quando viu “ovelhas que ele
tinha pintado numa pedra” (Vasari!). A outra lenda que se conta de
Giotto, é que era capaz de fazer um círculo perfeito sem compasso,
o famoso “O” do Giotto.
A obra de uma
pintura ou escultura na Alta Idade Média era feita por uma oficina
que tinha um chefe, o “protomestre” ou prothomagister,
que muito provavelmente dirigia a obra como um maestro de orquestra.
Quem materialmente realizava a obra eram os artesãos subordinados à ideação do chefe da obra – e aqui já esbarramos em uma questão
delicada: o romanticismo da “mão do artista”. Se o grande
maestro não toca pincel... fica difícil neste contexto falar em
“pincelada” de artista, não?!
Para ser o chefe da
obra, ou prothomagister,
o sujeito tinha que ter, com certeza, uma experiência danada para
cumprir com os contratos estipulados com quem pagava a obra; e a
concorrência era ferrenha.
Por
curiosidade, essa “hierarquia na obra”,
por assim dizer, vinha láááá de trás,
pois existe um decreto emitido por Diocleciano no ano de 301, no
qual são mencionadas duas classes de trabalhadores nas obras de
pintura, onde um era o ideador e o outro o executor.
Grandes
históricos da arte afirmam que tudo o que existe na Basílica
Superior de Assis foi pintado por Giotto. Uma corrente, na maior
parte estrangeira (Richard Offner diz isso desde 1939!), coloca essa
afirmação em dúvida e propõe a tese que um dos pintores de escola
romana (Jacopo Torriti, Filippo Rusuti e Pietro Cavallini) os teria realizado – neste caso, mais precisamente, Pietro Cavallini.
Essa
questão nasce sobretudo com a dúvida sobre a paternidade da
representação da “História de Jacó” na Basílica Superior deAssis. Nesta cena, nunca ficou cem por cento acertada a autoria de
Giotto, pela extrema maestria na realização dos volumes e
representação do espaço arquitetônico, além da utilização de
um vermelho muito quente, parecido com a tonalidade utilizada por
Cavallini nos afrescos do antigo refeitório de Santa Cecilia emTrastevere.
Após o restauro
(1974-1983) realizado por Bruno Zanardi em consequência do terremoto que a Basílica Superior sofreu, Zanardi defende a tese da autoria de Cavallini
e sustenta a sua tese com dois argumentos fortes: os afrescos que ele
restaurou na Sancta Sanctorum, reconstruída em 1279 após um
terremoto, onde embaixo de pinturas do período da contrareforma,
foram descobertos afrescos que combinavam os estilos pompeianos e
temas cristãos em maneira maravilhosamente “naturalista”. Além
disso, um importante achado durante este último restauro, que
poderíamos dizer, seria “a cereja sobre o bolo”: Zanardi
descobriu um “patrone”,
isto é, uma folha de papel cerado sobre a qual tinham pequenos
orifícios e que eram utilizadas como máscara para acelerar o
processo da realização do desenho, e em seguida do afresco, que,
como sabemos, tem que ter um tempo muito veloz de execução. Deste
“detalhe” supõe-se uma circulação de máscaras para realização
de afrescos entre os artesãos, que causaria a confusão na
identificação de cada mão. Nicolau III, o papa que comissionou os
afrescos da Sancta Sanctorum, era um protetor da Ordem dos
Franciscanos e poderia muito bem ter levado Cavallini para Assis.
Neste momento, ainda
não temos uma resposta definiva e a dúvida sobre a paternidade de várias representações da Basílica Superior de Assis permanece.
(Aí vem a lista!)
O bom é poder olhar
os três maiores pintores (e mosaicistas) romanos do século XIII,
Pietro Cavallini (Santa Cecilia, São Paulo Fora dos Muros, Santa Maria em Trastevere, São Crisógono, São Francisco em Ripa), Filippo Rusuti (Santa Maria Maior, Basílica Superior de Assis) e Jacopo Torriti (São João em Latrão, Santa Maria Maior, Basílica Superior de Assis) sob novos olhos, e
não mais como seguidores ou “alunos” (Vasari, em relação a
Cavallini) de Giotto!
Encerro assim o sexto ano deste meu blog sobre Roma, mostrando como Roma é o ponto de partida de um império e de um mundo inteiro e como tudo o que nasceu aqui é complexo e deve ser olhado com carinho e sobretudo com muita calma - como fazem alguns meus clientes caríssimos ;)
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